terça-feira, 11 de novembro de 2008

Importância da Religiosidade no Envelhecimento

A sociedade tem evitado o debate sobre a espiritualidade relacionada com a saúde ou a qualidade de vida, buscando formas mecanicistas e causal de interpretar e até simplificar as vivências humanas. A intenção é refletir sobre as possíveis implicações da espiritualidade no envelhecimento saudável. (Cupertino, 2004)

A espiritualidade pode ser um dos fatores facilitadores da adaptação diante das perdas, mudanças e alterações que estão presentes na medida em que os indivíduos envelhecem. Ela pode ter um papel protetor, fortalecendo o indivíduo para resistir e superar as perdas.

Há evidências de que a espiritualidade, assim como as práticas religiosas, contribui para o bem-estar na velhice e cada vez mais este tópico é incluído nos estudos sobre o envelhecimento. Trata-se de uma área controversa e de difícil investigação devendo ser salientado, no entanto a importância da multidimensionalidade e a diversidade dos conceitos de espiritualidade e de religiosidade. (Sommerhalder C & Goldstein LL, 2006)

O envelhecimento comporta desafios biológicos, fisiológicos e psicológicos que produzem crises existenciais é, no entanto, um fenômeno normal na vida. Como em todos os momentos do desenvolvimento vital, ao chegar a ultima etapa da vida, o idoso sente ainda surgir em si perguntas relativas à origem, destino e sentido de sua existência. Assim como realizar reflexões quanto à forma que viveu e viverá os próximos anos.

O que ocorre é que o ser humano é capaz de viver e até morrer por seus ideais e valores (Frankl, 2003, p.92). Dizia ainda que “não há nada de mais apropriado para que um homem vença ou suporte dificuldades objetivas ou transtornos subjetivos, do que a consciência de ter na vida uma missão a cumprir”. Esta missão tem um caráter específico duplo: “a missão não muda apenas de homem para homem, muda também de hora em hora, em decorrência do caráter irrepetível de cada situação. Esses aspectos da existência humana são constitutivos do seu caráter de sentido. Quanto mais ele apreende o caráter de missão, tanto mais verá sua vida cheia de sentido.

Como toda crise existencial, também essa da última etapa não pode ser superada de modo válido senão por meio da renovação da interioridade. A espiritualidade evidencia a existência de “potenciais forças escondidas no homem que o envelhecer faz desabrochar” (Baldessin, 2002).

Muitas pessoas, especialmente as idosas, experimentam uma forte interação entre sua fé religiosa e um senso de espiritualidade, incluindo tanto a “dimensão horizontal” da espiritualidade (que se dá nas experiências comuns do dia-a-dia), quanto à “dimensão vertical” (a que busca alcançar Deus).

A espiritualidade envolve a capacidade de se maravilhar, de reverência e gratidão pela vida. É a habilidade de ver o sagrado nos fatos comuns, de sentir a pujança da vida (Elkins, 2003). Remete a uma questão universal relacionada ao significado e o propósito da vida. (Sommerhalder & Goldstein, 2006)

Percebe-se que não existe um consenso na literatura quanto à definição de espiritualidade. Ela pode ser definida em três dimensões distintas: 1) espiritualidade como participação em uma instituição religiosa – comportamento objetivo; expressão formal da espiritualidade; 2) espiritualidade individual e/ou subjetiva – movimento ou disposição internos. Refere-se a uma “experiência interna e pessoal emitida em resposta a eventos da vida”; 3) espiritualidade expressada como crença integrativa a dar sentido e significado à existência humana. Como força integrativa entende-se a busca de significado que transcende o indivíduo. (Cupertino, 2004)

Portanto, a religiosidade como um fenômeno multifacetado, busca entender quais aspectos da religiosidade se relacionam com as várias funções psicológicas e o comportamento. De modo geral, há quatro dimensões: crenças, rituais (práticas ou atividades religiosas), experiência e conhecimento religioso.

Lukoff (1992, apud Farias e Seidl, 2006) distingue religiosidade de espiritualidade, sendo que a primeira pode ser definida como adesão a crenças e a práticas relativas a uma igreja ou instituição religiosa organizada; enquanto espiritualidade é a relação estabelecida por uma pessoa com uma força superior na qual ela acredita.

Enquanto a espiritualidade é uma reflexão sobre, a religiosidade remete a uma relação com. Essa relação pode ser com Deus ou com uma entidade. A palavra religião significa religar, restabelecer a ligação entre Deus e os homens. Portanto refere-se a comportamentos e crenças associados à religião. As religiões buscam responder à questão do significado da vida e possuem um código de ética que rege o comportamento e dita os valores morais. (Sommerhalder & Goldstein, 2006)

Molzahn (2007) considera que a espiritualidade é mais inclusiva e universal do que a religiosidade. É considerado relevante independente de a pessoa ter uma religião. É um estado de paz e harmonia e está relacionado ao significado da vida, doença e morte. Tem dimensão religiosa e existencial.

Para Cupertino (2004), percebe-se que o que marca as religiões e a espiritualidade é o fato de se relacionarem com o esforço de pensar a realidade de modo que faça sentido. A espiritualidade é importante para a população idosa e pode desempenhar um papel positivo na manutenção e na recuperação da saúde.

Existe hoje uma tendência dos órgãos oficiais em considerar a espiritualidade ao se falar de saúde. A Organização Mundial de Saúde (1998) reconheceu a importância da dimensão da espiritualidade como sendo essencial na definição de saúde, através da correlação positiva, demonstrada em publicações recentes, entre espiritualidade e qualidade de vida, quer seja em sua dimensão de saúde física, social ou mental.

Chally (2004) afirma que, de acordo com o National Institutes of Health (NIH), qualidade de vida inclui as dimensões de saúde, cultural, psicológica, interpessoal, espiritual, financeira, temporal e filosófica. Trata-se de um conceito subjetivo e contextual. É baseada apenas na experiência do indivíduo. Há uma falha no consenso da definição, cobrindo um leque de conceitos como status de saúde, status funcional, alegria, estilo de vida e depressão.

Estudos científicos demonstraram esta relação positiva. O levantamento de Koening, McCullough and Larson (2001 apud Molzahn, 2007) encontrou 724 estudos sobre espiritualidade neste século. Dois terços demonstraram associação positiva entre atividade religiosa e melhora da saúde mental, aumento do suporte social e menor abuso de drogas.

O estudo de Larson, Swyers & McCullough (1998) mostrou que espiritualidade é um fator positivo em como lidar com a doença, como prevení-la e ainda, ajudando no tratamento. (Molzahn, 2007)

Estudos transversais demonstraram que, embora as dificuldades de saúde e de locomoção levem à diminuição da participação em atividades religiosas institucionalizadas, a freqüência em atividades não-institucionalizadas (oração, leituras religiosas e programas religiosos) permanece inalterada e pode até aumentar (Ainlay, Singleton & Swigert, 1992 apud Sommerhalder C & Goldstein LL, 2006)

Portanto, o envelhecimento é uma realidade presente na sociedade moderna. Envelhecer com saúde e manutenção da satisfação e qualidade de vida é uma meta para os que alcançam a maior longevidade. A espiritualidade está relacionada com melhor saúde física e emocional entre os idosos e ainda pode ser uma estratégia de enfrentamento adequada para os fatores de estresse peculiares ao envelhecimento, como perdas e declínio.

Enfim, envelhecer abre o caminho para o desenvolvimento de um potencial humano, para um novo contexto de aprendizagem, que pode trazer descobertas até certo ponto, facilitadas pela espiritualidade.


Referências Bibliográficas
1- Chally PS e Carlson JM. Spirituality, Rehabilitation and Aging: A Literature Review. Arch Phys Med Rehabil. 2004 Jul, v 85, suppl 3.
2- Baldessin A. O idoso: viver e morrer com dignidade. In: Netto MP (Org.). Gerontologia: A velhice e o envelhecimento em visão globalizada. 2002; São Paulo : Ateneu, p.496.
3- Cupertino AP e Novaes C. Espiritualidade e Envelhecimento Saudável. In:CALDAS, Célia Pereira (Org.) Saúde do idoso: a arte de cuidar. 2. ed, 2004, Rio de Janeiro : Interciência, 399 p.
4- Faria JB e Seidl EMF. Religiosidade, enfrentamento e bem-estar subjetivo em pessoas vivendo com HIV/AIDS. Psicologia em Estudo, Maringá. 2006 Jan/abr, 11 (1) : 155-164.
5- Frankl VE. Psicoterapia e sentido da vida. 4ed. 2003, São Paulo : Quadrante.
6- Molzahn, AE. Spirituality in Later Life: Effect on Quality of Life. J Gerontol Nurs. 2007 Jan; 33 (1) : 32-39.
7- Sommerhalder C & Goldstein LL. O Papel da Espiritualidade e da Religiosidade na vida adulta e na Velhice. In: Freitas, Py, Neri, Cançado, Gorzoni e Rocha. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 2ed. 2006, Guanabara Koogan : Rio de Janeiro, p 1307-1315.

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