terça-feira, 9 de dezembro de 2008

ENVELHECER: UMA QUESTÃO DE ATITUDE

Virginia Satuf Silva Vieira.

“O mundo sofre de infantilismo. Em parte, a culpa é da publicidade.
Para ela, o homem ideal é um jovem ou quem sabe uma criança de peito.
Em troca, se envergonha dos velhos que, em outras épocas,
simbolizavam experiência e sabedoria”.
Milan Kundera

José Geraldo de Brito Filomeno definiu assim o que seria cidadania: "Poderíamos conceituar cidadania como a qualidade de todo ser humano, como destinatário final do bem comum de qualquer Estado, que o habilita a ver reconhecida toda gama de seus direitos individuais e sociais, mediante tutelas adequadas colocadas à disposição pelos organismos institucionalizados, bem como a prerrogativa de organizar-se para obter esses resultados ou acesso àqueles meios de proteção e defesa."
Entende-se como cidadania o ato de comprometer-se com os valores universais da Liberdade e da Vida condicionados pela Igualdade. A cidadania pressupõe o desenvolvimento de valores éticos que se objetivam nas seguintes virtudes cívicas: solidariedade, tolerância, justiça e valentia cívica, engendradas na relação da vida pública e vida privada.
No caso específico do idoso a dimensão de liberdade e conseqüentemente, o exercício da cidadania, depende da criação de condições favoráveis à manutenção de seu poder de decisão, escolha e deliberação. Tais condições serão efetivadas quando a sociedade perceber que precisa mudar seu comportamento em relação ao envelhecimento.
Infelizmente, como afirma Simone de Beauvoir, a classe dominante adota a posição cômoda de não considerar os velhos como homens: "se lhe ouvíssemos a voz, seríamos obrigados a reconhecer que é uma voz humana. "Na etapa da velhice, é comum observarmos que as pessoas que cercam o idoso, freqüentemente têm atitudes que contribuem para que ele vá perdendo a sua autonomia. Uma das piores formas de exclusão do idoso é seu isolamento em casa ou seu asilamento e na maioria das vezes a família, seguida pela sociedade e o Estado, aparece como principal responsável pela expropriação da autonomia do idoso.
O que ocorre é que muitas pessoas tem dificuldade em perceber que a velhice é mais que uma simples seqüência de anos e acontecimentos. A vida do idoso não se resume ao tempo de sua juventude, não se resume às suas lembranças. A vida do idoso continua e sua história pessoal se cruza com as histórias de outras pessoas, independente da idade. Assim, "o homem não está no tempo é o tempo que está no homem."
Não se fica velho aos 60 anos. O envelhecimento é um processo natural que ocorre ao longo de toda a experiência de vida do ser humano, por meio de escolhas e de circunstâncias. O preconceito contra a velhice e a negação da sociedade quanto a esse fenômeno colaboram para a dificuldade de se pensar políticas específicas para esse grupo. Ainda há os que pensam que se investe na infância e se gasta na velhice. Deve ser um compromisso de todo gestor em saúde compreender que, ainda que os custos de hospitalizações e cuidados prolongados sejam elevados na parcela idosa, também aí está se investindo na velhice “Quando o envelhecimento é aceito como um êxito, o aproveitamento da competência, experiência e dos recursos humanos dos grupos mais velhos é assumido com naturalidade, como uma vantagem para o crescimento de sociedades humanas maduras e plenamente integradas” (Plano de Madri, Artigo 6º).
O Brasil envelhece de forma rápida e intensa. No Censo de 2000, contava com mais de 14,5 milhões de idosos (IBGE, 2002), em sua maioria com baixo nível socioeconômico e educacional e com uma alta prevalência de doenças crônicas e causadoras de limitações funcionais e de incapacidades (Lima-Costa et al, 2003; Ramos, 2002). A cada ano, 650 mil novos idosos são incorporados à população brasileira (IBGE, 2000). Essa transição demográfica repercute na área da saúde, em relação à necessidade de (re)organizar os modelos assistenciais (Lima-Costa & Veras, 2003). A maior causa de mortalidade entre idosos brasileiros é o acidente vascular cerebral (Lima-Costa et al., 2000). Na transição epidemiológica brasileira ocorrem incapacidades resultantes do não-controle de fatores de risco preveníveis (Lima-Costa et al., 2003).
Uma importante conseqüência do aumento do número de pessoas idosas em uma população é que esses indivíduos provavelmente apresentarão um maior número de doenças e/ou condições crônicas que requerem mais serviços sociais e médicos e por mais tempo (Firmo et al, 2003). Isso já pode ser notado, uma vez que a população idosa, que hoje representa cerca de 9% da população, consome mais de 26% dos recursos de internação hospitalar no SUS (Lima-Costa et al, 2000). Além disso, é notável a carência de profissionais qualificados para o cuidado ao idoso, em todos os níveis de atenção. Outro fato importante a ser considerado é que saúde para a população idosa não se restringe ao controle e à prevenção de agravos de doenças crônicas não-transmissíveis. Saúde da pessoa idosa é a interação entre a saúde física, a saúde mental, a independência financeira, a capacidade funcional e o suporte social (Ramos, 2002).
Nos últimos 60 anos, o número absoluto de pessoas com 60 anos ou mais de idade aumentou nove vezes (Beltrão, Camarano e Kanso, 2004). Não só a população brasileira está envelhecendo, mas a proporção da população “mais idosa”, ou seja, a de 80 anos ou mais de idade, também está aumentando, alterando a composição etária dentro do próprio grupo. Significa dizer que a população idosa também está envelhecendo (Camarano et al, 1999). Em 2000, esse segmento representou 12,6% do total da população idosa brasileira. Isso leva a uma heterogeneidade do segmento idoso brasileiro, havendo no grupo pessoas em pleno vigor físico e mental e outras em situações de maior vulnerabilidade (Camarano et al, 2004).
O envelhecimento é também uma questão de gênero. Cinqüenta e cinco por cento da população idosa são formados por mulheres. A proporção do contingente feminino é tanto mais expressiva quanto mais idoso for o segmento. Essa predominância feminina se dá em zonas urbanas. Nas rurais, predominam os homens, o que pode resultar em isolamento e abandono dessas pessoas (Camarano et al, 2004; Camarano et al, 1999; Saad, 1999).
Cumpre notar que os idosos são potenciais consumidores de Serviços de Saúde e de Assistência. Esse grupo sabidamente apresenta uma grande carga de doenças crônicas e incapacitantes, quando comparado a outros grupos etários (Lima-Costa et al, 2003a; Lima-Costa et al, 2003b; Caldas, 2003). Disso resulta uma demanda crescente por serviços sociais e de saúde (Lima-Costa & Veras, 2003).
Incapacidade funcional e limitações físicas, cognitivas e sensoriais não são conseqüências inevitáveis do envelhecimento. A prevalência da incapacidade aumenta com a idade, mas a idade sozinha não prediz incapacidade (Lollar & Crews, 2002). Estudos brasileiros de base populacional em idosos apontam a existência de incapacidade entre idosos em cifras que variam de 2 a 45% dos idosos (Giacomin et al., 2005; Duarte, 2003; Lima-Costa, 2003; Rosa et al; 2003), dependendo da idade e do sexo.
Assim, torna-se imprescindível incluir a condição funcional ao se formularem políticas para a saúde dos idosos e responder, prioritariamente, às pessoas idosas que já apresentem alta dependência.
Envelhecer, portanto, deve ser com saúde, de forma ativa, livre de qualquer tipo de dependência funcional, o que exige promoção da saúde em todas as idades.
Com a perspectiva de ampliar o conceito de “envelhecimento saudável”, a Organização Mundial da Saúde propõe “Envelhecimento Ativo: Uma Política de Saúde” (2005), ressaltando que o governo, as organizações internacionais e a sociedade civil devam implementar políticas e programas que melhorem a saúde, a participação e a segurança da pessoa idosa. Considerando o cidadão idoso não mais como passivo, mas como agente das ações a eles direcionadas, numa abordagem baseada em direitos, que valorize os aspectos da vida em comunidade, identificando o potencial para o bem-estar físico, social e mental ao longo do curso da vida.
Todo profissional deve procurar promover a qualidade de vida da pessoa idosa, quando chamado a atendê-la. É importante viver muito, mas é fundamental viver bem. Preservar a autonomia e a independência funcional das pessoas idosas deve ser a meta em todos os níveis de atenção.
Ficam estabelecidos, portanto, os dois grandes eixos norteadores para a integralidade de ações: o enfrentamento de fragilidades, da pessoa idosa, da família e do sistema de saúde; e a promoção da saúde e da integração social, em todos os níveis de atenção.
Entre a política do “aparthied”, do racismo ilimitado dos anos 60 nos EUA e a eleição histórica do primeiro presidente negro do referido país, já se passaram 48 anos. Quanto tempo será necessário esperar até que políticas de atenção ao idoso possam sair do papel e virem a se concretizar?
Hoje, após esta imersão no universo do idoso através do Mestrado de Gerontologia da UCB,e pela rica experimentação das vivencias profissionais dos professores Vicente e Liz, somadas ainda a intensa troca de idéias e pensamentos das alunas desta cadeira especifica ,oriundas de diferentes áreas da saúde, tenho a certeza de que muito poderemos realizar,de forma multidisciplinar no cuidado e atenção do idoso. Mesmo neste micro-sistema no qual estamos inseridos, em nossas atividades básicas diárias de atuação, dependerá somente de nossas iniciativas e ações, fazer a diferença deste contexto. Atitude já!! Vamos a luta!!.

“O tempo não faz concessões”.(Rachel de Queiroz)

Bibliografia
BEAUVOIR, Simone de. A Velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1990.
BRITO FILOMENO, José Geraldo. Manual de Teoria Geral do Estado e Ciência Política. São Paulo: Forense Universitária. 1999
Envelhecimento, ética e cidadania
Pérola Melissa Vianna Braga 08.2001.

PORTARIA Nº 2.528 DE 19 DE OUTUBRO DE 2006.
Aprova a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

A MORTE
INTRODUÇÃO
A morte é um processo natural que ocorre ao longo da vida. Segundo Burlá, (2006), Os seres humanos merecem morrer com seus entes queridos próximos com conforto e em um ambiente tranqüilo. É preciso que profissionais de enfermagem tenham atuação e postura humanizada diante do paciente com doença crônica. A crença de que existe vida após a morte pode confortar o paciente diante da morte ou por outro lado deixá-lo temeroso. Conforme Becker, (1995) o medo da morte deve estar presente, com a finalidade de manter o organismo mobilizado para a autopreservação, mas não pode ser intenso na mente do individuo, caso contrário isso implicaria no impedimento do funcionamento do organismo.
Biologicamente, a morte é um evento que finda uma vida. Ocorre quando um órgão essencial deixa de realizar funções vitais. Segundo Lunardi et al, (2001), a morte é um evento capaz de despertar tantos sentimentos no indivíduo que está morrendo quanto nos que estão à sua companhia.


METODOLOGIA
Para este estudo realizou-se uma revisão da literatura no período compreendido entre 1977 a 2008, buscando as referências específicas sobre o tema em base de dados e periódicos científicos da área de saúde.

O significado da morte
Diante da possibilidade da própria morte ou de um ente querido, buscam-se várias formas de tratamento ou orações religiosas. Para Silva, et al, (1998), esse processo de morte seja de si próprio ou de outrem, passa por estágios emocionais bem definidos: negação raiva, barganha, depressão e aceitação. Entretanto, esse processo é particular ao indivíduo e nem todos passam por todos os estágios ou demonstram características comportamentais associadas a eles.
A morte é uma certeza para cada ser vivo, mas muitas pessoas vivem como se fossem eternos, se constituindo um grande mistério a sua atitude diante da mesma porque o homem não imagina a sua, apenas a do outro. Oliveira, (1992), diz que o homem é o único animal que sabe que vai morrer.
Segundo Starzewski Júnior, et al, (2005), existe a morte má e a morte boa, que exalta toda sua vida passada e tem a pessoa como quem fez muito pelos outros, a morte alegre, que não é enxergada como o fim de tudo, e a morte triste, a morte estúpida, sem nenhum significado, e a morte humana, com dignidade. Pires, (2004), apontam que muito do que se sabe sobre a antiguidade, a arte e a poesia ao longo de tantos séculos, depende da forma como os homens lidaram com a morte e suas tentativas de explicá-la.
Ao que parecem, todos escondem a possibilidade de o doente morrer, criando um clima de segredo, iludindo-o e às vezes o mesmo percebe que lhe escondem algo e teme pelo pior. Segundo Lahud (1993 p.214), “enquanto algumas pessoas tentam eufemizá-la, outros se apavoram diante dela”. Papaléo Netto,(1996), relata que na cultura ocidental a morte é excluída dos nossos pensamentos para que nada nos lembre a morte e o morrer.
Loureiro (2000 p.106) observa que “existe uma relação estreita entre a individualidade do homem e o seu horror pela morte, relação também constatada entre o grau de individualidade conseguida pelo homem e o tipo de sociedade em que vive.”
A consciência da morte e a reflexão que ela provoca estão nas raízes das filosofias e das religiões e movem a ciência aplicada à medicina a prolongar a vida humana, com melhor qualidade (LANNES, 2004). Para Lahud (1993 p.214), “na morte o indivíduo se acha só consigo mesmo e com sua realidade finita”. A morte é parte integrante de nossa vida, apesar de ser um mistério porque sempre sofremos diante da perda de um ente querido, mas é uma oportunidade de rever valores, perdoar e compreender.


A morte na atualidade
Atualmente, morre-se nos hospitais, tido como o local adequado para a morte. Esta morte é vista como diagnósticos médicos errados, não resolvidos ou casos negligenciados, e não como pessoas que findam o seu tempo de vida corporal. Starzewski Júnior, et al, (2005), nos informa que antigamente as pessoas morriam em casa, rodeadas de suas famílias e amigos, dando as últimas ordens e dispondo de suas últimas vontades.
Cuidando diariamente de pessoas em sofrimento na possibilidade de morrer a qualquer momento, surgem sentimentos contraditórios na equipe, devido ao fato de se estar em contato prolongado com o paciente e pelo desgaste físico e emocional. Torres, et al, (1989), refere que é preciso que se reformulem os currículos dos cursos de enfermagem para que haja um treinamento para comportamento diante da morte, e ocorra uma mudança de atitudes.
O abandono, solidão e carência afetiva levam idosos a desenvolver doenças somatizadas que podem levá-lo à depressão.
Há diferentes maneiras de lidar com a morte no dia a dia dos hospitais. Por isso é preciso compreender em que circunstâncias ocorrem e o que pode favorecer uma assistência humanizada. Pitta (1990), destaca que os enfermeiros seguem rigorosamente normas e condutas com objetivos de salvar vidas e evitar a morte e que quando acontece, pode causar um estado de frustração, pois ver o corpo de um paciente que se prestou cuidados se dedicou tempo e carinho é algo difícil de conviver.
Silva, et al, (2007), coloca que com o passar dos anos somos levados pelo próprio processo de viver, envelhecer e a enfrentar uma série de perdas significativas, como a morte de parentes e amigos.
As reações ao processo de perda por morte são manifestadas de maneira diferenciada entre as pessoas e dependem de várias situações que circundam a morte, como o tipo de relacionamento que existia, a idade, a doença prolongada, a força e a fé. Kubler-Ross, (2000) afirma que “a morte de quem se gosta provoca rupturas profundas, requerendo ajustamentos no modo de se perceber o mundo e de se fazer planos para continuar vivendo nele”.
Papaléo Netto, (1996), afirma que os idosos nos mostram as faces da vida e da morte, do tempo e da eternidade, do vigor e da fraqueza, do plantar e do colher, da grandeza e da limitação do ser humano.
Lima Júnior (2001) destaca que, até recentemente, os testes utilizados no diagnóstico de morte eram palpar o pulso e auscultar o coração e os pulmões, ou tão somente segurar um espelho junto ao nariz para confirmar a ausência de respiração através da falta de condensação no espelho. Atualmente se dispõem de aparelhos de última geração capazes de executar funções orgânicas com objetivo de prolongar a vida, como os respiradores e os hemodialisadores que substitui o rim.
Py & Trein, (2006) evidenciam que a condição de ignorar a finitude humana dificulta a relação do homem com a morte. Apesar da negação que existe em torno da realidade da morte nas unidades hospitalares, o idoso na cena de morte se submete ao desejo do outro.
Muitos idosos sofrem calados e conformados e são da mesma forma, excluídos da sociedade e, além disso, são rotulados como conformados, insistentes, fortes e coitados. Monteiro, (2001), refere que o cuidado ao idoso, além dos cuidados da artrose, do diabetes, da hipertensão, deverá incluir exercícios para mudar o modo de pensar a vida na velhice.
Conforme Smeltzer & Bare, (2006), no hospital, a morte muitas vezes é esperada, onde se tem como objetivo manter a pessoa que está à beira da morte, o mais livre possível de sofrimento e dor e levadas a ter uma morte com dignidade, num ambiente de tranqüilidade e paz.
Burlá (2006) relata que “Neste processo tem surgido novas condições clínicas, específicas de pessoas mais velhas, e novas ‘formas de morrer”. Já não se morre mais em casa, rodeado pelos amigos e parentes como outrora, mas no hospital, sozinho (ARIÈS, 1977). E os pacientes são condenados a internação por meses ou até anos de vida vegetativa, ligados a tubos e aparelhos, usados como instrumentos de desafio à morte. A civilização ocidental passa então a esconder a morte, evitando falar sobre ela. Como conseqüência, a atitude mais adequada para lidar com a morte de um ente querido seria fingir que nada aconteceu, que nada mudou, contribuindo, dessa forma, para o medo diante da morte, do desconhecido.
Quanto aos familiares e amigos, não lhes é permitido sofrer em público. Beauvoir (1990) relata que com a desculpa dada pelos outros de que precisamos ficar sozinhos para lidarmos com a perda e se choramos e sofremos por muito tempo as pessoas nos orientam a procurar um psiquiatra.
Neri & Sommerhalder (2002) lembra que nas cidades grandes temos pouco tempo e espaço para cultivar relacionamentos ou pensar sobre o sentido da velhice e da morte. Alves (2006) comenta que “a vida longa é um prêmio” e o idoso apesar dos problemas que enfrenta quer viver mais e plenamente, como prêmio por ter lutado ao longo de sua vida

A morte negada
Conforme a teoria do imaginário explicita, a preocupação de toda pessoa é a angústia do passar do tempo e o medo da morte. A história humana pode ser contada de acordo com a sociedade que vivenciou a morte em diferentes períodos; diferentes tempos e espaços, pois a cultura influencia assim como são marcadas no tempo.
Buscam-se fórmulas novas para retardar o envelhecimento, vendem-se ilusões de resgatar a juventude por meio de cosméticos e cirurgias plásticas, mas inevitavelmente chegará o momento que nada será suficiente para evitar a morte. Loureiro (...) lembra que o homem sabe que é mortal, mas inconscientemente se comporta imortal, pensa que quem morre é o outro e se esquece que a única certeza que temos é a da morte. Loureiro (2004) relata que todos se preocupam com a proximidade da morte, fazendo-os buscar formas de vencer o tempo. Imaginam-se eternos mesmo sabendo serem finitos. Surge então o imaginário, uma arma dada para o homem vencer o tempo e a morte de acordo com hábitos e costumes culturais das sociedades.



O comportamento diante da morte
Ariès (1977) historiador francês estudou a morte por 15 anos de sua vida. Segundo o mesmo, as mudanças de comportamento relacionadas à morte são muito lentas, com longos períodos de estabilidade. Segundo ele, nas sociedades primitivas, a morte era domada, Isto é, pensava-se que o moribundo sabia que ia morrer. E ninguém morria sem ser avisado por alguém ou por convicção, pressentimento.
Ariès (1977) relata que a partir do século XVIII, a morte se tornou dramática passando a ser encarada como se o homem tivesse sua vida roubada de si e de sua família, iniciando assim o culto aos cemitérios e luto exagerado colocando a família como personagem principal, quando não se temia a própria morte, mas a do outro. A partir do século XX, mais precisamente em meados de 1930, a morte foi se tornando um tabu, em que os familiares escondiam do moribundo sua real gravidade. E a morte se mudou para os hospitais.
E o autor denomina essa representação da morte de morte invertida, por ocorrer uma inversão nas características da morte, nas quais ela necessita passar despercebida, não sendo mais considerado um fenômeno natural do ser vivo, e sim, um fracasso. Tal representação leva a uma negação, a uma não aceitação da morte e a uma falsa sensação de que viveremos eternamente, aumentando, assim, o medo diante da morte.
A morte é uma certeza para cada ser vivo, mas muitas pessoas vivem como se fossem eternos, se constituindo um grande mistério a sua atitude diante da mesma porque o homem não imagina a sua morte, apenas a do outro. O paciente tem receio da circunstância que será a sua morte.
Burlá (2006) observa que o paciente tem medo da dor, de morrer só ou de incomodar seus familiares, de ser enterrado vivo e lembra-se da importância de conversar com ele e ouvir suas expectativas, porque, existe um medo maior de como será o processo de morrer do que com a morte propriamente dita.
A dor é um desconforto singular que varia de pessoa para pessoa e que se converte em medo da morte. A doença grave é sempre lembrada como prenúncio da morte. Albuquerque (2003) relata que ser doente significa sofrer e sofrer significa ser passivo e sentir desconforto que varia de intensidade.
Segundo Morin (1997) só existe dor provocada pela morte se há proximidade do morto, se é íntimo, familiar, amado ou respeitado, se o morto for desconhecido não existe nenhuma ou quase nenhum sentimento de dor.
É preciso esquecer por instantes, ao menos nestes últimos instantes, a frieza do hospital ao que estão acostumadas por ofício, e condicionar, como diz Py (2004), uma presença de amorosidade ao lado de toda a eficiência e competência profissional que, na verdade, só será realmente competente e eficiente, quando ao lado de uma titulação/qualificação existir nela a humanidade e solidariedade; existir uma pessoa humana que com outro humano interage em situação desigual de vida e de morte. Entender sentimentos, costumes, cultura e crenças do ser que está morrendo sob seus cuidados são fundamentos a serem exercitados.
O homem rejeita a morte e preenche essa certeza com mitos que são pensamentos construídos pelo imaginário; Conforme Morin (2000) explica: o homo sapiens é acometido pela morte como se esta fosse uma catástrofe irremediável, que traz angústia e horror e assim ela é vista como um problema vivo.
Biologicamente, a morte é um evento que finda uma vida. Ocorre quando um órgão essencial deixa de realizar funções vitais. Segundo Lunardi et al, (2001), a morte é um evento capaz de despertar tantos sentimentos no indivíduo que está morrendo quanto nos que estão à sua companhia. Loureiro (1993), afirma que foi demonstrado em pesquisas que o medo de morrer diminui com a idade, devido a alterações dos lobos frontais do cérebro.
Metchnikoff, o primeiro grande cientista que declarou guerra à morte. Pensava em preparar soros capazes de estimular e então regenerar as células nobres do organismo, pois tais soros seriam os verdadeiros rejuvenescedores do indivíduo Segundo ele, sabendo-se que um agente tóxico manifesta uma ação estimulante se empregado em pequena dose, então propôs o emprego de soros citotóxicos. Porém ele não conseguiu descobrir a dosagem exata e teve problemas com a lei francesa com relação à pesquisa. (MORIN, 1997).
Convém nos lembrar que um único ser vivo foi capaz de sobreviver até hoje, durante dois bilhões de anos. E este ser vivo está presente em cada um de nós, em todos os seres vivos do mundo. Mas essa herança da primeira célula se deveu à sua evolução, multiplicação e mutação. Morin (1997) lembra que o ser vivo não pôde resistir à morte senão evoluindo e que evoluir significa perder algo de sua identidade. Portanto o homem só pode escapar da morte aceitando a metamorfose, ou seja, numa morte-renascimento. A velhice e a morte estão inscritas na herança genética. Portanto a velhice e a morte ocorrem em conseqüência do ciclo vital da diferenciação celular. Burlá ( 2006) afirma que “Reconhecer o processo de morrer é tão importante como dar um diagnóstico”.
A questão mais interessante da origem da vida é a origem da morte. Morin, (1997) lembra que, quanto mais especializado é um organismo vivo, mais se reduzem as possibilidades de regeneração biológica, pois apenas os tecidos vulgares são passíveis de regeneração, assim um anfíbio como os sapos podem regenerar um membro amputado enquanto que um vertebrado superior está condenado a morrer ou continuar deficiente, pois as células nervosas, que são o tipo celular mais diferenciado perdem rapidamente a capacidade de reprodução. Parece então que a morte é o preço da especialização, da perfeição.
Ariès (1977) conta que na antiguidade existia um ritual diante da morte. O moribundo era avisado por convicção ou signos naturais, que estava prestes a morrer. Então eram tomadas as providências, reunia-se a família e amigos, lamentavam, choravam e pedia perdão aos amigos e familiares, que teria de responder: “Eu te perdôo aqui e perante Deus” e inclinavam um para o outro e o moribundo recomendava a Deus os vivos e escolhia sua sepultura. Fazia uma prece composta de duas partes: a culpa – “Deus, minha culpa, por tua graça, por meus pecados...” confessa sua culpa de mãos juntas e elevadas para o céu, roga a Deus que lhe dê o paraíso. A segunda parte da prece é chamada de commendatio animae também chamadas de recommendaces: “ Verdadeiro pai, que nunca mentiste, tu que chamas de volta Lázaro de entre os mortos, tu que salvas Daniel dos leões, salva minha alma de todos os perigos...” e então recebia a absolvição sacramental , o Libera, onde incensava e aspergia água benta, pelo padre após a confissão.
Na idade média a morte era pública, enquanto que nas sociedades modernas a morte é vista como um dos maiores perigos da vida do indivíduo. Ela vai sendo empurrada para os bastidores da vida social (ELIAS, 2001).
Ariès (1977) conta que a assistência diante da morte era igual à de nascer, precisava de cuidados. A morte era esperada e cuidada com atenção. Por muitos séculos se morreu com a prática de rituais que davam ao moribundo a ilusão de continuarem ligados a esse mundo, se esquecendo da angústia diante da morte.
Segundo Kubler Ross (2000, p. 278) o paciente em fase terminal necessita de cuidados especiais, mas o mais importante é ouvi-lo e observar o moribundo em silêncio. Agindo assim pode se perceber um cessar em paz. A autora diz que: “Observar a morte em paz de um ser humano faz-nos lembrar uma estrela cadente. É uma entre milhões de luzes do céu imenso, que cintila por um breve momento para desaparecer para sempre na noite sem fim”. Sendo a morte inevitável e imprevisível, deveríamos expressar nossos sentimentos diante das pessoas que amamos. Apreciar a beleza da natureza, das flores, como se nunca mais pudéssemos vê-las novamente.

CONCLUSÃO

Mesmo fazendo parte da vida das pessoas a morte é vista como tabu, um evento assustador cercado de mistérios que dificultam a aceitação e enfrentamento. O medo da morte é cultural, pois para lidar com a angústia, todo indivíduo utiliza mecanismos de defesa para lidarem com a morte e o morrer. Atualmente a morte é vista como fracasso profissional, e não como finitude humana ou como diagnósticos médicos errados, não resolvidos ou casos negligenciados, e não como pessoas que findam o seu tempo de vida corporal.

REFERÊNCIAS
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